Em entrevista ao Portal da Liderança, Torben Rankine, Diretor da West Coast Sales e US Country Manager da Leadership Business Consulting, referiu que ter "sucesso como líder em Silicon Valley depende menos das suas competências pessoais e mais da sua capacidade para influenciar e envolver os outros".
Portal da Liderança (PL): Quais os principais desafios com que se deparam os líderes americanos na atualidade?
Torben Rankine (TR): Hoje em dia os líderes enfrentam uma quantidade de meios de comunicação que os podem ajudar mas que também os podem prejudicar. Os média sociais são uma força que não existia há uma década atrás e existe hoje uma exigência crescente pela transparência. Ainda assim, os rumores e as publicações falsas espalham-se rapidamente. Muitas vezes, um cliente pode ouvir uma queixa ou sobre um evento numa dada empresa no Twitter ou no Facebook, antes de esta ter tido tempo para formular uma resposta ao problema ou desafio. Isto não é apenas relevante para o mundo externo, mas também para dentro da organização. Um líder de hoje deverá saber como e quando deve transmitir as mensagens. A capacidade de um líder persuadir e convencer através de histórias e de saber quando é a altura certa para o fazer é muito mais importante agora do que alguma vez foi.
A comunicação é o maior desafio que se coloca hoje em dia aos líderes americanos.
PL: Está ligado a vários programas para empreendedores e executivos em Silicon Valley, nomeadamente o Global Strategic Innovation: International Executive Program & International Entrepreneurial Program. Quais as mais-valias deste programa para os líderes lusófonos?
TR: Estes programas foram feitos para inspirar e mudar a perspetiva das pessoas sobre a gestão, a inovação e a liderança. Silicon Valley é um lugar único, com um ecossistema e uma cultura única. Essa cultura transcende as organizações. Os líderes lusófonos que vêm ao programa GSI verão como as organizações e a gestão de topo funcionam em Silicon Valley. Existe um fator que está a ter uma grande influência na gestão de topo em Silicon Valley e que está a reter o talento dentro das próprias organizações. Com tanta concorrência pelos melhores engenheiros e gestores, as empresas estão a incorporar uma cultura corporativa que motiva as pessoas, não só do ponto de vista monetário, como também do ponto de vista social, e os motiva para a missão. Os líderes lusófonos verão como isto molda a cultura e os estilos de gestão em Silicon Valley.
PL: O Portal da Liderança teve oportunidade de falar com alguns participantes de anteriores edições do GSI. O que está na base da grande satisfação e sentimento de mudança que nos dizem sentir?
TR: Penso que existem duas coisas que sobressaem e que mostram o nível de satisfação e o sentido de mudança nos participantes:
- O programa abre a mente dos participantes e permite ver o poder da colaboração, da confiança e do valor de fazer coisas (o conceito de “design thinking”, inovação aberta, interação rápida e prototipagem). Sublinha o facto de que quatro dos cinco elementos da inovação são competências cognitivas, ou seja, capacidades que podemos aprender. Estas são: observação, questionação, networking e experimentação. O único elemento que não pode ser aprendido é a “associação”, ou seja, a forma de ligar os quatro elementos da inovação de modo a ver a sua relevância e fazer a diferença.
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O valor do networking, não só entre empresas e universidades, que são como os anfitriões do programa, como também entre os próprios participantes. Ao longo do programa têm a oportunidade para interagir, durante uma semana, com os colegas de outras empresas em países diferentes. Uma coisa que os participantes levam depois de ter aprendido sobre “design thinking” é o valor de “polinização-cruzada”, a crença de que a diversidade de opiniões e de input leva a conceitos e produtos mais ricos.
Esta semana acaba por ser tão intensa e dinâmica que os participantes saem daqui inspirados e com a crença de que podem fazer a diferença (e podem mesmo).
PL: É country manager da Leadership Business Consulting nos EUA. Que conselhos dá aos líderes da lusofonia que pretendem entrar no mercado americano?
TR: A questão refere-se ao mercado dos EUA, mas na verdade, os EUA tem diversos mercados, uma vez que cada Estado tem o seu próprio conjunto de leis e cada um, por sua vez, demografias e contextos diferentes. Os norte-americanos tendem a ser muito focados e orientados para os resultados. Portanto, um líder lusófono deverá adotar a mesma abordagem: ser focado, saber o que quer, ter objetivos e fazer tudo o que pode para conseguir com que esses objetivos se realizem.
Devido à pressão dos negócios diários, os ciclos de atenção são curtos, por isso, qualquer líder que queira ter a atenção de um cliente, parceiro ou potencial funcionário, tem que ter o seu “pitch” pronto. Um “pitch” é um conceito utilizado muito em Silicon Valley e que se refere a dever ter a sua história bem estruturada e definida antes de falar com alguém. Deve saber com quem está a falar e o que quer deles. Um pitch normalmente consiste num:
Ideia-chave: Este é a ideia-chave e o propósito que prende a atenção. Deve ter uma formulação estimulante.
Necessidade: Que necessidade está a satisfazer? Identifique as necessidades específicas do consumidor, “um analgésico e não uma vitamina”. Fale do tamanho do mercado, do crescimento, dos players e das ruturas. Qual é o seu primeiro segmento de mercado?
Abordagem: Descreva brevemente o produto ou serviço que está a oferecer. Qual o seu posicionamento? Tem uma diferenciação sustentável? Qual o seu modelo de negócio e qual a estratégia para entrar no mercado Descreva brevemente as finanças e a equipa.
Benefícios por Custos/ Valor: Descreva os benefícios de utilizar o seu produto ou serviço para os clientes, para os investidores, para os funcionários e para os parceiros.
Concorrência e alternativas: Especifique a concorrência, mostre que conhece o espaço. Têm barreiras de entrada defensivas?
Fecho: Resumo e requisitos explícitos para os próximos passos.
Resumindo, um líder lusófono que quer entrar no mercado americano, deverá fazer o seu trabalho de casa para determinar onde deverá começar (que Estado ou cidade), quais os objetivos a traçar e focar-se na melhor forma para os alcançar. Na San Francisco Bay Area, as pessoas ouvirão o que tem a dizer se tiver uma proposta interessante, independentemente de onde você é. Trata-se de uma comunidade baseada em mérito.
PL: Esteve ligado ao desenvolvimento de negócio numa gestora de ativos. Como se gere o risco num investimento?
TR: O risco equivale a desconhecimento e é por isso que você é recompensado com um prémio se investir no risco. O capital de risco e o investimento são estratégias de que têm esse nome por uma razão. Um investidor investe geralmente numa fase inicial de uma startup, sendo que o capital de risco permitirá o crescimento da empresa. São ambos investidores de risco. Muitas vezes investem em empresas que não têm receitas ou um número significativo de clientes. Medir o potencial risco financeiro e o retorno de uma empresa sem receitas é muito complicado. Quanto maior for o risco tomado, maior deverá ser o retorno.
Os bons investidores de risco são capazes de escolher equipas vencedoras, capazes de ler o mercado e de levar os seus projetos ao sucesso.
PL: É diretor da West Coast Sales. Que conselhos dá aos líderes no sentido de obterem melhores resultados?
TR: Esteja focado e motivado, construa relacionamentos baseados na confiança e no benefício mútuo, mantenha-se calmo quando existem movimentações e distrações à sua volta. Ser capaz de progredir, ainda que com pequenos passos, é uma evolução positiva. Isto potencia a crença e a moral. Os líderes deverão ter a visão, a persistência e a persuasão para conseguir o melhor das suas equipas. Criar equipas à volta de desafios e metas com um da propósito e recompensas definidas irá gerar resultados.
PL: Está ligado a vários programas para empreendedores e executivos em Silicon Valley. Quais os segredos para o sucesso de quem passa por Silicon Valley?
TR: Silicon Valley é uma comunidade global e multicultural que funciona de duas maneiras. É uma comunidade de dar e receber, onde os empresários bem-sucedidos irão reinvestir no ecossistema. Ao saber que Silicon Valley é uma comunidade, precisa de aprender a interagir ela, saber quando deve perguntar, quando deve dar, quando deve partilhar e quando deve ocultar. O ecossistema prospera numa cultura única, que inclui franqueza e colaboração. As pessoas daqui querem estar envolvidas na próxima grande rutura e inovação. O risco de não ajudar uma startup ou um empreendedor e perder a próxima grande oportunidade, faz com que as pessoas sejam abertas à colaboração. Portanto, venha para Silicon Valley com uma mente aberta, esteja disposto a colaborar, venha com ambição e confiança, e compreenda que construir relacionamentos não acontece da noite para o dia. Silicon Valley não deverá ser um passo no seu caminho para ser uma pessoa de negócios. Deverá ser antes um lugar onde vem consecutivamente para partilhar e construir ideias.
PL: O que faz de Silicon Valley um centro de inovação por excelência?
TR: A capacidade que Silicon Valley tem de juntar capital e talento. Trata-se de uma comunidade baseada no mérito e não na posição ou na origem. É uma cultura única no mundo.
Existe um relatório excelente da Startup Genome chamado Start-up Ecosystem Report, que classifica os top 20 ecossistemas empresariais no mundo. Silicon Valley é o 1º em oito indicadores diferentes. Os aspetos-chave do ecossistema incluem: acesso ao financiamento, mentores, rede de colaboração, mentalidade, acesso ao talento, taxas de sucesso e tendências.
Silicon Valley tem um histórico que também permite manter o ritmo. Ser capaz de confiar num advogado que ajudou centenas de empresas IPO (cotada em bolsa) ou a vender a empresa, é um enorme benefício, tal como trabalhar com um contabilista que está à vontade com a forma e as estruturas do capital e que ajudou milhares de startups em várias fases de investimento. O percurso histórico torna Silicon Valley ainda mais eficiente.
Silicon Valley é uma comunidade baseada no mérito e não na posição ou na origem.
PL: Quais as principais lições de liderança que se aprendem em Silicon Valley?
TR: Estar aberto a ideias e opiniões, porque aqui as coisas tornam-se velhas rapidamente. Tem que se continuar a inovar ou ser-se-á esquecido. Isto significa que um líder nunca está “confortável” e que está sempre a ser solicitado para procurar novos caminhos para o crescimento e para a sustentabilidade. Este ambiente significa que os líderes têm que ser mais flexíveis e que procurar constantemente novos caminhos para a colaboração e para o crescimento (orgânico ou através da aquisição).
O sucesso como líder em Silicon Valley depende menos das suas competências pessoais e mais da sua capacidade para influenciar e envolver os outros, para pensar de forma diferente e agir propositadamente e com sucesso em direção a uma meta comum.
Torben Rankine é Country Manager da Leadership Business Consulting nos EUA e tem mais de 14 anos de experiência em gestão internacional e investimento. Torben tem uma licenciatura em Estudos de Negócios e Espanhol da Universidade de Edimburgo. Começou a sua carreira na banca corporativa para o ABN Amro Bank em Buenos Aires. Depois trabalhou como consultor de gestão para o DHV Group em Lisboa e Madrid. Tem estado a trabalhar na Bay Area há sete anos e está ativamente envolvido no ecossistema de startups em Silicon Valley. Coordena os programas da Global Strategic Innovation e gere também o Portugal Ventures Accelerator em Redwood City.