Helena Gonçalves: A liderança é um ponto fraco de muitas organizações portuguesas

Helena Gonçalves: A liderança é um ponto fraco de muitas organizações portuguesas
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Em entrevista ao Portal da Liderança, Helena Gonçalves, Coordenadora Científica da Pós-Graduação em Gestão da Sustentabilidade do ISEG/Idefe, referiu que "António Mexia tem liderado um processo de mudança de uma grande empresa portuguesa, tornando-a numa referência internacional nas suas áreas de atuação". 

Portal da Liderança (PL): Enquanto coordenadora científica da pós-graduação em Gestão da Sustentabilidade do ISEG, que analisa o tema sob a perspetiva empresarial, de que forma é possível desenvolver e conciliar virtuosamente a vertente económica, social e ambiental em contexto de liderança empresarial? 

Helena Gonçalves (HG): Hoje, cada vez mais, a sustentabilidade deve ser uma área onde se estabelecem objetivos de forma continuada para a empresa. Compete aos gestores, através de uma liderança eficaz, isto é, aquela que permite realizar os objetivos organizacionais e é inclusiva, concretizar a estratégia de sustentabilidade na perspetiva do triple bottom line: alcançar o desenvolvimento económico, contribuindo para uma sociedade mais justa e um ambiente mais limpo. A pós-graduação em Gestão da Sustentabilidade, a iniciar a próxima edição em Outubro de 2013 mantendo ainda as inscrições abertas, para além de desenvolver e consolidar conhecimentos na área da sustentabilidade, fornece as competências e o conhecimento necessários para implementar uma estratégia integrada de sustentabilidade transversal a toda a empresa. 

PL: Como é que a gestão da sustentabilidade é geradora de mais-valias para a empresa, para os colaboradores e para a comunidade? 

HG: A gestão da sustentabilidade gera mais-valias para a empresa ao contribuir, por exemplo, para melhorar a imagem e reputação institucional, reduzir custos e obter níveis de eficiência mais elevados; gera mais-valias para os colaboradores, por exemplo, ao proporcionar um ambiente de trabalho mais estimulante, respeitando os direitos dos trabalhadores e humanos, desenvolvendo relações dos empregados mais positivas, contribuindo assim para melhor alcançar as suas expectativas, aspirações e desenvolvimento de carreira; gera mais-valias para a comunidade, por exemplo, ao minimizar riscos ambientais, nomeadamente através de maior eficiência energética e utilização de fontes de energia limpas, ao investir em programas de educação e preservação do ambiente e ao participar no desenvolvimento local conjuntamente com entidades comunitárias. Uma gestão sustentável é fonte de vantagem competitiva para a empresa. 

PL: Como é que se liga a tecnologia à gestão da sustentabilidade? 

HG: O desenvolvimento tecnológico tem-se processado a um ritmo cada vez mais acelerado e em domínios muito diversos e contribui de modo importante para a gestão da sustentabilidade. O desenvolvimento de processos produtivos mais eficientes e menos poluentes, de fontes de energia renováveis, de produtos/componentes recicláveis e reutilizáveis, de produtos mais leves e mais pequenos, resultado da utilização de novas tecnologias, são disso alguns exemplos. 

PL: Que ferramentas de suporte são passíveis de ser usadas para definir e monitorizar os índices de sustentabilidade?

HG: Existem diferentes e variados índices que são usados para avaliar o desempenho sustentável das empresas. Genericamente, são constituídos por indicadores ambientais, económicos (micro e macro), sociais e institucionais. Alguns exemplos de índices dirigidos a empresas cotadas em bolsa: O Dow Jones Sustainability Indexes que congrega cinco índices e elenca as empresas pontuando-as de acordo com critérios económicos, ambientais e sociais; o FTSE4Good Index Series que considera dimensões de sustentabilidade diferentes do caso anterior e a forma de avaliação é feita considerando aspetos sociais, ambientais e éticos na análise financeira tradicional. Existem também linhas de orientação para a comunicação da sustentabilidade das organizações, desenvolvidas pela Global Reporting Iniatiative (GRI) que englobam os desempenhos ambientais, sociais e económicos dos seus produtos e serviços e das suas atividades. Os esquemas conceptuais associados aos diferentes índices e orientações podem servir de referência para aplicação em qualquer organização. 

PL: É especialista em green marketing. Pode este fazer toda a diferença na gestão dos mercados sem prejudicar os resultados? Como? 

HG: O green marketing, no essencial, visa a identificação e satisfação das necessidades dos clientes e da sociedade, de forma lucrativa e sustentável, minimizando assim o impacto no ambiente, através de um processo de gestão holístico. Contribui, por exemplo, para a oferta de produtos mais amigos do ambiente, dando assim resposta às necessidades dos clientes e da sociedade; contribui para a imagem e reputação sustentável da empresa ou dos seus produtos e serviços.


A empresa ao posicionar-se no mercado através de uma oferta mais sustentável, distingue-se das demais e pode daí obter vantagem competitiva.


Esta, pode não se refletir de imediato nos resultados mas será certamente visível num horizonte temporal mais alargado.

PL: Enquanto doutorada em Organização e Gestão de Empresas, como vê a liderança empresarial em Portugal?

HG: É facto conhecido que existe falta de competitividade da economia portuguesa devido à falta de produtividade das organizações portuguesas e de muitas empresas. A fraca produtividade é influenciada por diversos fatores. Um fator muito importante tem a ver com a forma como são geridas as empresas e como as pessoas são lideradas e os processos são organizados. A liderança é um ponto fraco de muitas organizações portuguesas e, por isso, necessita ser melhorada. É necessário congregar as vontades das pessoas dentro da organização para alcançar objetivos mais ambiciosos e conseguir desenvolver e executar processos de mudança que são necessários a uma economia em mutação. 

PL: Ao nível das capacidades de liderança, o que faz falta em Portugal?

HG: É fundamental mais conhecimento de gestão e dos processos e técnicas de liderança. A liderança é influenciada por capacidades inatas, mas também se pode aprender e desenvolver. As capacidades associadas a um líder são diversas. O líder deve focar-se nos interesses das organizações e também nos interesses dos colaboradores, para que estes se sintam valorizados, motivados e comprometidos em alcançar os objetivos organizacionais. 


Melhor formação em gestão permite melhorar as capacidades de liderança, e isto deve ser uma aposta forte das empresas.


PL: Em termos de liderança em português, qual o líder que destaca e porquê?


HG: De entre as personalidades conhecidas publicamente temos felizmente alguns bons líderes empresariais. Podendo ser injusta por não citar vários, realçaria um que tem liderado um processo de mudança de uma grande empresa portuguesa, tornando-a numa referência internacional nas suas áreas de atuação, a EDP Energias de Portugal. A forma eficaz como a empresa tem sido liderada tem sido evidenciada também pelos prémios que a empresa tem ganho, onde se destaca o lugar alcançado no Dow Jones Sustainability Index. Estou a referir-me a António Mexia.

PL: Quais os desafios que se colocam à liderança no feminino em Portugal?

HG: As questões da igualdade de género continuam na ordem do dia. Existem recomendações, e não só, a nível nacional e internacional, para promover uma maior participação das mulheres em processos de decisão e no desempenho de funções de chefia/liderança em diferentes domínios, dado o grande desfasamento em relação à existência de gestores/líderes masculinos. Atualmente, em Portugal, devido à crise económica, o número de empresas diminui (5,5%, de 2010 a 2012) bem como o número de funções de gestão e direção (8,5%, de 2010 a 2012), de acordo com um estudo da Informa e D&B (2013). Apesar disso, assiste-se a um crescimento positivo das mulheres na gestão e liderança das empresas. Para isso, tem contribuído também o desenvolvimento do empreendedorismo feminino. 


É nas empresas de maior dimensão e de maior antiguidade que o peso das mulheres em cargos de gestão/liderança é mais reduzido, e consequentemente, onde se encontram os maiores desafios.

 


Helena-GonçalvesHelena Gonçalves é doutorada em Organização e Gestão de Empresas, pelo ISEG Universidade Técnica de Lisboa, Professora Auxiliar do ISEG, Coordenadora Científica da Pós-Graduação em Gestão da Sustentabilidade do ISEG/Idefe e Co-coordenadora do Mestrado em Marketing do ISEG.