Sete Notas Breves sobre Liderança

Sete Notas Breves sobre Liderança
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Poucas áreas se prestarão tanto a equívocos e más ideias feitas, como a da liderança. “Os líderes nascem”. “São carismáticos”. “São diferentes”. “Têm uma faceta heróica”. É claro que alguns líderes se aproximam destas ideias. 

Todavia, muitas pessoas normais, dotadas das necessárias competências e forças de carácter, podem exercer eficazmente a liderança. Essas pessoas aprendem a liderar melhor. Percebem que a liderança é uma jornada de melhoria e não uma lotaria genética. Rodeiam-se da equipa certa. Procuram bons mentores. Em suma, intuem a natureza profunda da liderança.

Sete Notas Breves sobre Liderança

Se a importância da liderança parece inquestionável, muitas ideias sobre o processo são, no mínimo, discutíveis. Os líderes são frequentemente representados de forma romântica, como aproximações às figuras de super-heróis ou estrelas de Hollywood. A nossa proposta é simples: basta de representações hollywoodescas!

Entendamos os líderes como pessoas competentes e com vontade de melhorar o mundo em redor. Essas pessoas percebem que a melhoria – sua, dos outros e das suas organizações – não resulta de traços sobre-humanos e de dons carismáticos. Resulta sobretudo de trabalho, perseverança (para enfrentar obstáculos), humildade (para aprender com os erros), utilização do seu potencial, e autoconhecimento (das forças e fraquezas próprias).

A liderança deve, portanto, ser vista de forma diferente: como uma prática profissional norteada pela melhoria contínua. Seguem-se sete notas que ajudam a situar a liderança nestes termos.

1. A liderança é uma maratona

A liderança é uma jornada de aprendizagem para a vida. Nenhum líder deve deixar de investir no seu desenvolvimento. A análise das vidas dos líderes de referência revela isso mesmo: os seus percursos evolutivos são longos e resultam da capacidade de melhoria ao longo do tempo. Uma vitória “ao sprint” pode ser fonte de satisfação, mas não oferece prova de resistência. Os profissionais com “fibra” de líderes estão conscientes de um facto incontornável: liderar organizações de modo sustentável requer ganhar a guerra, e não apenas obter saliência numa ou várias batalhas.

Mais: estes profissionais aprendem ao longo do tempo a temperar a exaltação da vitória com o controlo do desespero na derrota. Em carreiras de longo curso, as vitórias e as derrotas são inevitáveis. Aprender com os erros e as derrotas é uma marca das melhores lideranças.

procura2. Todo o desenvolvimento é autodesenvolvimento

Os bons líderes sabem que a liderança se aprende e que requer um exercício contínuo de desenvolvimento. Estão também conscientes de que todo o desenvolvimento é autodesenvolvimento. Por muito que a organização disponibilize ferramentas de desenvolvimento em liderança – e as melhores não deixam de o fazer – não é possível estimular nem potenciar o desenvolvimento de quem não quer desenvolver-se.

3. Liderar é como tocar jazz: apreciando a estética da imperfeição

Com o decurso do tempo, os líderes vão aprendendo que liderar é como tocar jazz: uma forte combinação de estrutura e improvisação. Sabem que, se introduzirem excessiva estrutura, asfixiarão a equipa e neutralizarão o talento. Mas também sabem que a escassez de estrutura gerará caos e descoordenação. Cabe-lhes pois descobrir a combinação virtuosa de estrutura e liberdade. Os líderes que se inspiram nos músicos de jazz percebem também o valor da imperfeição: não é possível progredir e avançar sem cometer alguns erros honestos. Belmiro de Azevedo diz que: “Ser líder é promover um estado de insatisfação permanente, de querer ser mais e melhor, mas tolerante ao erro inteligente”. A imperfeição pode ser estética: ela indica o caminho da melhoria, da humildade e da resiliência. As falhas são inerentes à nossa natureza imperfeita. Aprendamos com elas.

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4. Os bons líderes multiplicam

Os bons líderes acreditam que o talento é abundante. Que quase todas as pessoas têm talentos valiosos. São, por isso, capazes de procurar talento em pessoas improváveis. Não se deixam iludir por rótulos. Diferentemente, outros líderes consideram o talento como escasso e estático. Não veem potencial para lá do óbvio. É esta diferença que distingue os líderes multiplicadores dos líderes diminuidores. Os multiplicadores libertam potencial, estimulam e fazem crescer os colaboradores. Os diminuidores estiolam e inibem a expressão das qualidades dos outros. As suas equipas não progridem e os membros talentosos parecem perder qualidades outrora relevadas. Os colaboradores do líder multiplicador crescem; os do diminuidor definham. O diminuidor, pouco confiante nas suas possibilidades, rodeia-se de pessoas menos competentes, ou que lhe fazem menos “sombra”. Os efeitos para a organização são previsíveis!

5. A liderança vê-se na ausência do líder
Os melhores líderes estão conscientes de que a liderança se afirma quando eles próprios estão ausentes. A ausência do líder motiva alterações comportamentais significativas nos seus colaboradores? As pessoas “relaxam” se o líder se ausentar? Ou, pelo contrário, os comportamentos dos liderados não dependem da presença do líder, sendo sempre empenhados? A observação do comportamento dos liderados na ausência do líder é o teste ácido da democraticidade no seio da equipa. Líderes democráticos levam a equipa a assumir os objetivos como seus. Líderes autocráticos influenciam pelo medo e pela hierarquia. Liderar sem recorrer às ferramentas da hierarquia: eis o desafio para os líderes das novas organizações.

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6. A liderança é um trabalho de equipa

Quando pensamos em liderança, ocorre-nos frequentemente a figura do líder. Todavia, a liderança é um processo assente em trabalho de equipa – não um ato solitário. Como tal, a jornada de desenvolvimento deve ser feita em colaboração.

Algumas organizações proporcionam mentores e coaches aos seus colaboradores. Mas parcerias adicionais são necessárias. A questão que o líder deve colocar a si próprio é a de saber se identificou os parceiros necessários para realizar os seus objetivos. Se quer seguir uma carreira internacional, já identificou os colegas que o podem ajudar a lidar com as dificuldades da expatriação? Se planeia regressar à origem, já identificou quem o pode ajudar a tornar o regresso mais suave? Se gostava de fazer um MBA, já identificou os seus aliados para tornar o sonho realidade? Liderar, incluindo a liderança da nossa carreira, é um trabalho de equipa. O papel da rede de apoio é crítico. Compreender o papel das redes é portanto necessário.

7. A liderança deve ser positiva

Como recentemente afirmou Jonas Ridderstrale ao Expresso, os líderes são traficantes de esperança. Devem ser exemplos de virtude e de positividade. Naturalmente que liderar é um exercício difícil e nem sempre compatível com a positividade. O caminho é frequentemente estreito. Mas a tónica deve ser colocada na obtenção de efeitos positivos – não apenas para o próprio, mas também para a equipa, a organização e a sociedade. Os líderes devem ser exemplos de virtuosidade – que não é incompatível com competitividade. Pelo contrário, a criação de valor partilhado e a fidelidade a valores inclusivos são ingredientes necessários para dignificar a profissão da gestão e o empresariado. Como escreveram Michael Porter e Mark Kramer, os lucros não são todos iguais, pelo que o desafio é claro: como obter lucros que criem valor partilhado para as organizações e para a sociedade.

Continue a ler sobre este tema em "Sete Testes para Futuros Líderes e para os que Pretendem Desenvolver-se".


MiguelPCunhaMiguel Pina e Cunha é professor catedrático na Nova School of Business and Economics de Lisboa da Angola Business School, desenpenhando funções de diretor académico do The Lisbon MBA. Doutorado em Gestão pela Universidade de Tilburg e agregado em Teoria das Organizações pela Universidade Nova de Lisboa, tem vindo a investigar, entre outros temas, a relação entre as organizações e a sociedade. Recebeu o Prémio RH 2007 na categoria investigação, em conjunto com Arménio Rego.

ArmenioRegoArménio Rego é doutorado e agregado em Gestão, lecionando na Universidade de Aveiro. É autor e coautor de mais de três dezenas de livros, tendo desenvolvido projetos de consultadoria em liderança e gestão de pessoas e realizado dezenas de conferências, seminários, wokshops e eventos de formação de executivos. Foi agraciado com diversos prémios em Portugal e no estrangeiro.