Do outro lado da porta

Do outro lado da porta
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Imaginemos um grupo de pessoas fechado numa sala. Não se conhecem, mas sabem que vão ter de encontrar uma forma de sair. Surgem dois tipos de pessoas: as que assumem e as que seguem. E, atenção, as que assumem não são necessariamente líderes. 

Pedro Crespo

Vamos imaginar um grupo de pessoas fechado numa sala. Não se conhecem, nunca se viram, mas sabem que vão ter de encontrar uma forma de sair dali. Sabem ainda que, quando saírem, vão continuar juntos e que, para além daquelas quatro paredes, esperam-nos várias salas, onde terão de interagir com outras pessoas desconhecidas. Sabem de tudo isto, é certo, mas, por agora, estão todos juntos numa só sala e com um objetivo: sair dali.

É nesta altura que surgem dois tipos de pessoas: as que assumem e as que seguem. E, atenção, as que assumem não são necessariamente líderes. São apenas aquelas que não conseguem ficar paradas a ver acontecer. Já os outros preferem que lhes indiquem o caminho a seguir.

Naturalmente, o grupo começa a olhar à volta e, independentemente da forma como cada elemento se sente, procura a saída. A sala tem pouca coisa mas tem uma porta. Há mesmo uma saída. Apesar das poucas instruções, todos se unem em prol de um só objetivo.

A partir daqui tudo muda. Os fins não são assim tão comuns e o que seria igual para todos pode não ser. Tudo porque os indivíduos são diferentes, com agendas e preferências próprias. Até o tom de voz pode influenciar a forma como o grupo “vê” uma pessoa. Todos têm uma opinião de como sair da sala, mas só dois ou três a manifestam. São os tais que ficam inquietos por não se mexerem, os que assumem.

Naquela sala surge, em pouco tempo, uma dinâmica de desconforto e desunião. Alguns gritos, por vezes, e posições mais extremistas levam a que o grupo se esqueça que todos querem o mesmo: sair dali. Os que seguem desistem e os que assumem chocam entre si, como se estivessem em competição pelo prémio da melhor solução. Os desistentes são esquecidos e, mesmo quando parecem ter descoberto o “mapa do tesouro” – a solução para sair –, acabam por passá-lo aos outros, mesmo que inconscientemente.

Durante a sua formação é comum os grupos passarem por quatro fases: forming, storming, norming e performing.

Voltemos à sala. Vivida a fase inicial – forming, de perceberem quem são e que todos querem sair dali –, rapidamente as personalidades de cada um vêm à superfície. E eis que surgem os líderes, os opinion makers, os que têm sempre uma resposta mas nunca assumem riscos ou responsabilidades, os introvertidos, os analíticos, ou os críticos mais destrutivos. Entram, de seguida, na fase do storming. Regra geral, é a pior fase, mas também a que mais ensina em termos individuais. Quanto mais compatíveis as pessoas forem mais suave é a curva do storming. Nesta altura, os grupos sofrem mutações, mudam de rumo, de elementos, de estratégia, e podem até afundar. Alguns desistem da fase seguinte, o norming. Naquela sala tem de estar a equipa mais eficaz, com regras para interagir, com papéis claramente definidos e aceites. É a missão que deve conduzir o grupo à última fase: performing.

Et voilá! Conseguiram, finalmente, sair da sala. A experiência marcou-os, tornou-os mais fortes, mais conscientes de que cada um tem o seu papel. Uns com maior visibilidade que outros mas todos importantes.

A sala é uma metáfora para a integração de jovens nas empresas. A chegada a um mundo novo, com outros iguais a eles, feitios próximos ou distantes, sem saberem o que vão fazer ou como fazer e com objetivos umas vezes mais claros que outros.

A verdade é que ninguém nasce ensinado, e ter uma boa receção à saída da sala – à chegada a uma empresa – é meio caminho andado para que tudo corra bem. Mas se a recebê-los estiverem os chamados “velhos do Restelo”, o mais certo é haver sarilho!

08-05-2017


Pedro Crespo Small

Pedro Crespo, talent manager na área de pessoas e organização da Novabase desde 2006, é licenciado em Informática e Gestão de Empresas pelo ISCTE. Em 1996 iniciou a carreira no mundo da consultoria, primeiro na Arthur Andersen e mais tarde na Deloitte. Em 2004 rumou aos Açores, para ocupar o cargo de CHRO na Nicolau Sousa Lima, e depois o de CFO na Verdegolfe. Seguiu-se a Novabase, onde tem trabalhado em áreas relacionadas com a cultura, liderança, formação e comunicação, tendo-se especializado em metodologias de design thinking e gamificação, em particular na sua aplicação à gestão e retenção de talento.