Presidentes-chairmen ou Presidentes-CEO? - Camilo Lourenço

Presidentes-chairmen ou Presidentes-CEO? - Camilo Lourenço

Os Presidentes deviam funcionar como “chairmen” do país. Um chairman é alguém que, por não ter funções executivas, pode pensar para além do curto prazo. Da gestão operacional. E que por isso aponta objectivos estratégicos.

Numa altura em que se completam 40 anos sobre a revolução de Abril, importa perceber que Presidentes tivemos nós: Presidentes-"chairmen" (líderes)? Ou Presidentes-CEO (gestores operacionais)?

Desde 1976, o Palácio de Belém já teve quatro inquilinos: Ramalho Eanes, Mário Soares, Jorge Sampaio e Cavaco Silva. Todos ocuparam o cargo por dois mandatos. Eanes funcionou como a transição da tutela militar (MFA) para a tutela civil e teve um contributo fundamental para a pacificação da sociedade. Mas não tinha pensamento estratégico, razão que devia ter desaconselhado um segundo mandato.

Seguiu-se Mário Soares, que passou o primeiro mandato a garantir a reeleição. Já nos segundos cinco anos funcionou, a espaços, mais como CEO do país (tarefa da responsabilidade do 1º ministro), do que como chairman. Com Sampaio passou-se algo parecido: pouco conhecedor de questões económicas, não percebeu que, com a adesão ao Euro, Portugal precisava de um novo objectivo estratégico. E ajudou a complicar o problema orçamental com a célebre frase “Há mais vida para além do Orçamento”.

De Cavaco Silva esperava-se postura diferente. Até pela sua formação económica. Como os principais desafios do país estavam na frente económica (reformas estruturais) e financeira (contas públicas desequilibradas), pensou-se que seria um Presidente mais exigente. Mas a sua praxis decepcionou: a necessidade de garantir a reeleição e o receio da impopularidade, levou-o a condescender com os desvarios financeiros que nos colocaram, pela terceira vez em 34 anos, à beira do abismo.

Conclusão: o país tem um défice de liderança. Nenhum dos quatro Presidentes que tivemos apontou qualquer objectivo de médio e longo prazo para Portugal. Nenhum deles foi, enquanto Presidente, um agente activo de mudanças estruturais. Soares-1º ministro, por exemplo, foi muito mais estratega com o pedido de adesão à Europa do que Soares-Presidente. E tal como os três que se lhe seguiram, não deu nenhum contributo para o maior problema da Democracia: o descontrolo das finanças públicas. Problema que, recorde-se, é recorrente: a desordem orçamental foi a grande pecha da 1ª República e da monarquia constitucional…

O país não será viável se não tivermos líderes que pensem onde queremos estar daqui a 10 ou 15 anos. E na forma de lá chegar. Quem melhor do que os Presidentes para fazer esse papel? É esta reflexão que precisamos de fazer, passados 40 anos sobre Revolução que nos devolveu a Liberdade.

 



Camilo-Lourenco-Cronicas

Camilo Lourenço é licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa. Passou ainda pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque e University of Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Passou também pela Universidade Católica Portuguesa. Entre a sua experiência profissional encontramos redator principal do “Semanário Económico” (desde 1988); coordenador da secção Nacional do “Diário Económico” (de que foi um dos fundadores) desde 1990. Diretor adjunto da revista “Valor”, que ajudou a fundar (1992). Diretor da mesma revista (1993), onde se manteve até 1995. Editor de Economia da Rádio Comercial, de 1992 a 1997. Diretor editorial das revistas masculinas da Editora Abril/Controjornal: “Exame” (revista que também dirigiu); “Executive Digest”, entre outras. Comentador de assuntos económicos da Rádio Capital, de 2000 a 2005. Diretor da revista “Maisvalia” (de 2003 a 2005). Comentador da RTP e RTP Informação, onde passou também a apresentar o programa “A Cor do Dinheiro” (desde 2007). Colunista do “Jornal de Negócios (desde 2007); comentador de assuntos económicos da Media Capital Rádios (desde 2010). Numa das rádios do grupo, a M80, apresenta dois programas: “Moneybox” e “A Cor do Dinheiro”. Comentador de assuntos económicos da televisão generalista TVI, onde apresenta “Contas na TV”. A par destas funções, Camilo Lourenço é docente universitário. Lecionou na Universidade de Lisboa, na Universidade Lusíada e no Instituto Superior de Comunicação Empresarial. Por outro lado leciona pós-graduações e MBA. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a fazer palestras de formação, dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como Liderança, Marketing e Gestão. Em 2007 estreou-se na escrita, sendo o seu livro mais recente “Saiam da Frente!”, sobre os protagonistas das três bancarrotas sofridas por Portugal que continuam no poder.