Empoderar o empoderamento feminino: porquê o esforço?

Empoderar o empoderamento feminino: porquê o esforço?
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Os programas de empoderamento feminino são necessários e úteis? E será a participação em workshops e afins suficiente para garantir um verdadeiro empoderamento das mulheres nas organizações e para que se usufrua do investimento feito?

Andrea Correia de Jesus

Em nosso redor multiplicam-se os programas de formação e workshops com foco no empoderamento feminino, a maioria direcionada para mulheres profissionais e/ou em cargos de liderança. Escolas internacionais reconhecidas como o Insead, com o “Aspiring Women Leaders Programme”, ou Oxford, com o “Women’s Leadership Development Programme”, e organizações de menor dimensão como a Contact SA, sob o título sugestivo “She is Strong”, ou a Girl MOVE Academy (que tem parceria da Católica Lisbon), com o “Girl MOVE: Believe, Build, Change”, acrescentam este tipo de programas ao leque de formação profissional.

Questiono-me: será esta avalancha de oferta realmente necessária e útil? E, enquanto as mulheres participam nos programas de empoderamento feminino, onde estarão os homens? Onde andam os colegas, chefes, amigos, parceiros dessas mulheres?

No nosso mundo, em que tópicos como a igualdade salarial entre homens e mulheres, capacidades de liderança mais frequentes em mulheres do que em homens líderes, benefícios da diversidade e da inclusão na produtividade e na colaboração, e a importância de manter a atratividade como empregador têm preenchido primeiras páginas de jornais e revistas e já fazem parte integrante do nosso mindset profissional, reflito sobre quais serão os benefícios de investir em formação em empoderamento feminino.

Debruço-me sobre os tópicos apresentados nos variados programas à escolha. Em quase todos constam a confiança em si própria, comunicar de forma assertiva e motivadora, diversidade e inclusão, reconhecer os próprios bias/ideias pré-concebidas em relação à posição da mulher na sociedade e no trabalho. A nível de capacidades de liderança acrescentam ainda gestão de conflito, tomada de decisão, assertividade. Muitos destes tópicos são comuns a formações de liderança de executivos, parecendo existir alguma redundância. Questiono então algumas mulheres que participaram neste tipo de programas para entender o que retiraram dos mesmos. Muitas referem um aumento na confiança em si próprias; a oportunidade de partilhar com outras mulheres os desafios maioritariamente enfrentados por elas no local de trabalho; a oportunidade de fazer networking e a partilha de experiências com outras mulheres líderes e profissionais experientes. No topo da lista surgem a melhoria de confiança em situações de apresentações, por exemplo, para um grupo de direção ou para um grupo alargado, e também uma maior segurança em exercer a sua função de acordo com a sua personalidade, sem sentir que se tem de fingir.

Reconheço os benefícios de trabalhar as capacidades de liderança, melhorar a presença num contexto só feminino no qual a possibilidade de expressão e o encorajamento das coparticipantes atuam como uma alavanca para a aprendizagem pessoal e o reforço de uma imagem própria positiva. Decerto uma experiência muito empoderadora, que bem se traduz no entusiasmo dos relatos de quem participa. No entanto, será esta participação em programas e workshops suficiente para garantir um verdadeiro empoderamento das mulheres nas organizações e para se usufruir do investimento feito?

Tal como o agricultor que prepara a terra para colocar as plantinhas que já germinaram na estufa, qualquer organização que trabalhe a diversidade e a inclusão no seio das suas equipas, que proporcione espaço aos seus líderes e ao seu talento para desenvolverem as suas capacidades (de liderança) de acordo com a sua individualidade, e que promova o feedback e a colaboração como formas de desenvolvimento decerto retirará os melhores benefícios da oferta de formações focadas no empoderamento de mulheres.

A boa notícia é que é muito fácil adquirir atividades de formação externas de qualidade no sentido de promover o empoderamento feminino junto das colaboradoras. Mas a verdadeira transformação organizacional terá de passar pelo “core”, e as organizações que queiram assumir o empoderamento feminino como compromisso terão de fazer mais do que comprar formação externa. Voltando ao exemplo do agricultor, há que introduzir e usar as ferramentas adequadas para preparar a terra.

Algumas das práticas mais simples e utilizadas com sucesso por várias empresas, independentemente da sua dimensão e do seu setor, passam por:

1. Identificar potencial talento (homens e mulheres) cedo na carreira, e a atribuição de ferramentas adequadas para o desenvolvimento das suas capacidades (de liderança), como feedback contínuo, por exemplo, com base em projetos, coaching.

2. Estabelecer programas de mentoria (para homens e mulheres) tendo em atenção afinidades pessoais (mesma área funcional, mesma origem étnica) e que também focam em sponsoring/patrocinar o talento identificado com potencial, por exemplo, em reuniões de planeamento de sucessão.

3. Incentivar a participação das colaboradoras em organizações profissionais ou eventos que sejam liderados por mulheres para terem oportunidade de fazer networking e de aprender liderança com modelos femininos.

4. Promover atividades de networking na organização como, por exemplo, “working mums lunch” (“almoço de mães trabalhadoras”).

5. Introduzir alguma flexibilidade de horários ou carga de horas semanal no espetro contratual da organização.

6. Por último: criar alianças e aliados, ao promover a participação de todos (homens e mulheres), em atividades, workshops, palestras dedicadas ao tema “empoderamento feminino”.

Se por um lado há ainda bastante “terra a lavrar” por parte das organizações, este artigo não ficaria completo sem um apelo a todas as mulheres profissionais, quer sejam líderes ou não, que também elas contribuam para o empoderamento feminino no seu dia a dia. Para tal têm de apostar no seu trajeto de crescimento pessoal, aproveitando oportunidades de feedback e de aprendizagem, cultivando a confiança nas suas capacidades e arriscando formas de comunicação mais claras e assertivas quando exprimem a sua opinião ou quando falam dos sucessos alcançados. Sem receio, dando autorização a si próprias e sentindo-se empoderadas.

07-03-2024

Portal da Liderança


AndreaJesus

Andrea Correia de Jesus, formada em Economia pela Universidade Nova de Lisboa, é apaixonada pelo desenvolvimento de pessoas. Com experiência estratégica e operacional junto de equipas e stakeholders a todos os níveis, é especialista em desenvolvimento de liderança na empresa internacional de consultoria de gestão LBC. Regressou ao país de origem, Portugal, após uma carreira internacional especializada em gestão de talento – em que trabalhou na Daimler e na Mercedes em países como os EUA, Reino Unido, França, Singapura e, mais recentemente, na Alemanha. O seu foco é colaborar com líderes no sentido de melhorarem o impacto dos negócios na globalização, assim como na atração e no desenvolvimento de talento.