Acaba de sair do fim de semana, ou ainda mal chegou de férias e só apetece queixar-se de tudo e mais alguma coisa? Pois pode parar de reclamar – pelo bem do seu cérebro e da sua saúde (mental e física).
Durante uma conversa a maioria das pessoas queixa-se uma vez por minuto. Pode ser tentador reclamar – porque sabe bem, mas, como muitas outras coisas que sabem bem e aliviam – como fumar a seguir a uma refeição, ou comer demasiados doces – queixarmo-nos constantemente não faz bem, declara Travis Bradberry – coautor do best seller “Inteligência Emocional 2.0”, num artigo na Entrepreneur.
O também cofundador e presidente da consultora americana TalentSmart acrescenta que o nosso cérebro adora eficiência e não gosta de trabalhar mais do que é suposto. Quando repetimos um comportamento, como queixarmo-nos, os nossos neurónios ramificam-se uns nos outros no sentido de facilitar o fluxo de informação. Tal torna mais fácil repetir o comportamento no futuro – de tal forma que podemos nem perceber que o estamos a fazer. Mas o nosso cérebro não pode ser culpado – quem iria querer construir uma ponte provisória de cada vez que tem de atravessar um rio? Faz muito mais sentido erigir uma ponte permanente. Assim, os neurónios ficam mais juntos, e as conexões tornam-se mais fixas. Os cientistas referem-se a este processo com a frase “neurónios que disparam juntos, ligam-se juntos”.
Queixarmo-nos de forma repetitiva reestrutura o nosso cérebro por forma a que, no futuro, se torne mais provável reclamar. Com o passar do tempo, torna-se mais fácil ser negativo do que ser positivo, independentemente do que se passa à nossa volta. E reclamar acaba por se tornar o nosso comportamento padrão, o que também muda a forma como as pessoas nos veem, refere Travis Bradberry.
Mas há mais: reclamar danifica outras áreas do nosso cérebro. Um estudo da Universidade de Stanford mostra que reclamar encolhe o hipocampo – parte do cérebro fundamental para a resolução de problemas e o pensamento inteligente. Causar danos no hipocampo pode ser assustador, sobretudo se tivermos em consideração que esta é uma das primeiras áreas do cérebro a serem afetadas pela doença de Alzheimer.
Reclamar faz mal à saúde
Embora não seja um exagero dizer que reclamar causa danos cerebrais, o problema não fica por aqui. Quando nos queixamos o nosso organismo liberta cortisol, a hormona do stress. O cortisol coloca-nos em modo de “luta ou fuga”, desviando oxigénio, sangue e energia de tudo o resto que não seja os sistemas essenciais para a sobrevivência imediata. Um dos efeitos do cortisol, por exemplo, é aumentar a pressão arterial e o nível de açúcar no sangue para estarmos preparados para fugir ou nos defendermos. Ou seja, todo o cortisol extra libertado pelas reclamações constantes debilita o nosso sistema imunológico e torna-nos mais suscetíveis a níveis elevados de colesterol, diabetes, doenças cardiovasculares e obesidade; até torna o cérebro mais vulnerável a acidentes vasculares cerebrais.
Dado que somos seres inerentemente sociais, o nosso cérebro imita de forma natural e inconsciente o estado de espírito de quem nos rodeia, sobretudo das pessoas com quem passamos a maior parte do tempo. Este processo é denominado por “neurónios-espelho”, e é a base da nossa capacidade de sentir empatia. Assim, o ato de reclamar é muito parecido com fumar – não é preciso sermos nós a fazê-lo para sofrer os efeitos nocivos. Temos de ter cautela em relação ao tempo que passamos com as pessoas que se queixam de tudo. Os “rezingões” querem que os restantes se juntem aos seus queixumes para que possam sentir-se melhor consigo mesmos. É ver a situação por este prisma: se uma pessoa estivesse a fumar, ia sentar-se ao lado dela toda a tarde a inalar o fumo em segunda mão? Não: iria distanciar-se. E é o que tem de fazer com quem está constantemente a queixar-se/reclamar contra tudo e todos.
A solução para parar
Há duas coisas que podemos fazer quando tivermos necessidade de reclamar. Uma delas é cultivar uma atitude de gratidão. Ou seja, quando sentirmos vontade de reclamar, desviar a atenção para algo pelo qual estamos gratos. Ter tempo para contemplar aquilo pelo que somos gratos não é apenas a coisa certa a fazer: reduz os níveis de cortisol em 23%. Um estudo realizado na Universidade da Califórnia, Davis, concluiu que as pessoas que trabalham diariamente para cultivar uma atitude de gratidão revelam melhorias nos níveis de humor e de energia, e têm substancialmente menos ansiedade devido a níveis mais baixos de cortisol. De cada vez que tiver pensamentos negativos ou pessimistas, aproveite para inverter a marcha e pensar em algo positivo. Com o tempo, a atitude positiva irá tornar-se um modo de vida.
A segunda coisa que pode fazer – e apenas quando tem algo que vale realmente a pena reclamar – é queixar-se de forma orientada para a solução. Pense nisso como reclamar com um propósito; como fazer uma reclamação em relação a um serviço prestado, por exemplo. Ao queixar-se de modo orientado para a solução deve fazer o seguinte:
1. Ter um propósito claro. Antes de se queixar, saiba qual é o resultado que pretende. Se não conseguir identificar um propósito, há grande probabilidade de estar a reclamar só por reclamar, e isso é o tipo de comportamento que deve cortar pela raiz.
2. Começar com algo positivo. Pode parecer contraintuitivo iniciar uma reclamação com um elogio/cumprimento, mas começar num tom positivo ajuda a evitar que a outra pessoa fique na defensiva. Por exemplo, antes de avançar com uma reclamação sobre um mau serviço ao cliente, pode começar por dizer algo como: “Sou vosso cliente há bastante tempo e fiquei sempre muito satisfeito com o vosso serviço...”.
3. Ser específico. Quando está a reclamar não é boa altura para desenterrar todos os pequenos aborrecimentos dos últimos 10 anos. Basta referir-se à atual situação e ser o mais específico possível. Em vez de dizer: “O seu funcionário foi rude”, descreva especificamente o que o funcionário fez que lhe pareceu rude.
4. Terminar num tom positivo. Se terminar com: “Nunca mais cá compro nada”, a pessoa do outro lado não tem nenhuma motivação para ter a reclamação em conta. Neste caso, está apenas a queixar-se por se queixar. Em vez disso, reafirme o seu propósito, bem como a expectativa de que o resultado desejado pode ser alcançado, dizendo, por exemplo, “gostava de resolver a questão para podermos manter a nossa relação comercial intacta.”
Tal como fumar, beber demais, ou ficar no sofá o dia inteiro a ver televisão, reclamar faz-nos mal. Ao seguir estes pequenos passos estará a colher os benefícios físicos, mentais e de desempenho associados a um estado de espírito positivo.
24-01-2024
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