Quantos Líderes Há Numa Organização?

Quantos Líderes Há Numa Organização?
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O João está frustrado. Ao fim de dois anos como CEO, o que sobressai é uma extrema dificuldade em distribuir de forma inteligente o seu tempo pelas várias frentes.   


Por um lado, tenta focar o crescimento em novos mercados – o que implica viagens, tempo longe do escritório e da equipa e, mais importante, ter tempo para olhar o futuro sem ter que resolver permanentemente o presente. Por outro lado, é preciso manter felizes os clientes e mercados habituais – o que implica assegurar que a sua organização e as suas pessoas cumprem as expectativas, veem as oportunidades que surgem, entendem que o crescimento só será sustentável se recrutarem e treinarem uma nova geração a quem delegar. Na verdade, a sua maior frustração – partilhada em várias ocasiões com o Presidente – reside no facto de não ter conseguido construir ao longo destes anos uma estrutura suficientemente sólida e capaz de gerir autonomamente a maioria das questões.

A maioria dos executivos séniores identifica-se com alguma parte da história. Em muitas das nossas conversas com chefias de topo, a palavra “pro-atividade” é talvez a mais usada para descrever a frustração decorrente da gestão de talento. É nesta fase que muitos profissionais de Recursos Humanos começarão a discutir as soft skills – estará o CEO a comunicar corretamente a sua visão, conseguirá ele motivar as pessoas na direção certa, haverá uma cultura de confiança na organização, etc. 

Mas estas são questões que – apesar de muito relevantes – focam apenas os sintomas do problema, não as suas causas. E muitas vezes, a resposta a estes sintomas esgota-se numa série de cursos e workshops sobre Liderança, todos com o objetivo de ensinar as pessoas a comunicar melhor, a gerir melhor uma equipa e todos, tipicamente, com reduzido impacto na performance global da organização.

O que está então realmente em jogo? Um pequeno exercício pode ajudar-nos a focar a discussão. Peça a 15 pessoas da sua empresa (inclua pessoas de diferentes níveis hierárquicos) que descrevam a estratégia da organização. Pergunte-lhes depois de que forma a estratégia impacta os seus objetivos e o enfoque do seu trabalho.

As respostas à primeira questão são geralmente muito vagas e utilizam lugares comuns como “ser o melhor na área”, “melhor qualidade ao mais baixo preço” e “servir melhor o cliente”. As respostas à segunda questão são… ainda mais vagas: “mais eficiente”, “trabalhar de forma mais inteligente”, “mais focado no cliente” são expressões referidas com frequência. Finalmente, encontraremos diferenças significativas nas respostas, tendo em consideração o nível hierárquico do inquirido e a área funcional em que se enquadra – profissionais de Recursos Humanos terão a sua própria interpretação da estratégia, diferente daquela que profissionais de Finanças e Marketing têm, que por sua vez também difere.

duvidaE é aqui que reside o problema. Na maioria das organizações, o único impedimento a uma comunicação eficaz, a uma melhor liderança, a um efetivo trabalho de equipa, é a capacidade de todos entenderem o foco estratégico da organização, o impacto que este tem nas suas atividades diárias e nas expectativas que recaem sobre as suas equipas. Logo que isto seja compreendido e aceite por todos, e aqui a aceitação é geralmente determinada pela compreensão, muitos dos sintomas anteriormente mencionados dissipar-se-ão. Ora, entender o foco estratégico da organização depende geralmente das pessoas estarem confortáveis com os designados hard skills – os indicadores financeiros do negócio, os imperativos operacionais, as ferramentas de marketing – o que só acontece quando se combina conhecimento técnico com experiência.

Diz-nos a experiência que a falta de hard skills faz com que seja muito difícil para qualquer profissional assumir um papel de liderança, seja para com os clientes, a sua equipa ou a empresa. Porque, em última análise, na base dos indicadores de sucesso da organização, estão sobretudo os resultados hard. Além disso, se é possível melhorar as competências pessoais de um bom gestor, será difícil ver melhorias em termos de soft skills em profissionais que não entendem o negócio – de onde vêm os nossos resultados, como é que os nossos concorrentes desenvolveram a sua estratégia, quais os indicadores-chave da nossa performance e, já agora, porque fazemos o que fazemos, a todos os níveis da organização.

Com bons soft skills, um gestor embrulha melhor a sua “expertise” e consegue disseminar esta lógica aos vários níveis da organização. Mas sem um claro entendimento do negócio, arrisca-se a ser pouco credível, gerando uma onda de efeitos negativos, como por exemplo o cinismo.

Para agravar a situação, a velocidade da mudança – dos recursos, das profissões, dos contextos – obrigam-nos a reanalisar constantemente o nosso modelo de negócio, o nosso modelo económico e o nosso mercado.

A ordem mundial alterou-se. As empresas estão a mudar, os clientes estão a mudar, as tendências estão a mudar. E, neste contexto, as organizações concentradas em assegurar que os seus quadros possuem um forte conhecimento do negócio – os hard skills – adaptam-se com maior facilidade e apresentam melhores resultados globais. Se os hard skills estiverem espalhados pela generalidade dos níveis e áreas da organização, é mais provável que a mudança tenha um impacto positivo. Por si só, os soft skills (ou o conhecimento de apenas uma parte do negócio), não garantem que isto aconteça.Mas, para a organização do futuro, não se trata de desenvolver alguns líderes, mas o maior número possível de líderes – líderes no serviço ao cliente, líderes no backoffice, líderes no departamento de Recursos Humanos… líderes em todas as hierarquias que – antes de tudo – entendem o negócio, o seu papel e o papel das suas equipas no negócio. 

 

Adaptado a partir daqui.

Nadim HabibNadim Habib,  líbano-dinamarquês, diplomado pela London Schoool of Economics, CEO da Nova Fórum, é responsável pela formação de executivos da Nova Business School of Business and Economics e professor da Angola Business School.