Como começar um discurso? Com uma piada? Com uma história pessoal? Ajudem-me!

Como começar um discurso? Com uma piada? Com uma história pessoal? Ajudem-me!
7 minutos de leitura

O início de um discurso (e de uma entrevista ou apresentação) é um momento sensível. Para si, que sente o nervoso miudinho. E para a audiência, expetante com a possibilidade de que os aborreça de morte.

Sara Batalha 

O início de um discurso (e de uma entrevista ou apresentação) é um momento sensível. Diria mesmo: tenso para todos os oradores. Por um lado, sente o nervoso miudinho e a ansiedade do desconhecido, e talvez ainda não se sinta tão seguro quanto gostaria. Por outro, também a audiência está tensa, mas por um motivo completamente diferente: estão preocupados e expetantes com a possibilidade de o seu discurso os aborrecer de morte. “Talvez devesse ter trazido mais material para ler, devia ter perguntado se alguém já cá tinha estado, devia ter carregado o telemóvel ou devia ter ficado em casa e assim não perdia tempo…”. Todos – inclusive a sua mensagem – estão em risco.

Talvez seja por isso que muitos oradores ainda gostam de começar um discurso com uma piada. O único problema desse início é ser difícil, diria mesmo, arriscado. A minha sugestão? Não se dê ao trabalho. Até porque, se não funcionar, o impacto é muito mais danoso do que conseguir arrancar uma gargalhada ou um pequeno sorriso da audiência. Mesmo que já tenha feito um workshop com os Improváveis, deixe esse papel para quem sabe, sim?

Para ser um comunicador mais eficaz tem de seguir apenas uma destas duas opções: 1) Vai falar sobre si (ou sobre a sua empresa/produto/serviço)? Ou (2) vai falar sobre algo minimamente interessante para a sua audiência? Se for uma celebridade, como … … … … (pense numa de quem goste muito), pode falar apenas sobre si, que a audiência vai achar interessante. Mas se não for uma famosa estrela de cinema internacional, recomendo que inicie a discussão com um tema que seja claramente interessante para a sua audiência, logo nos primeiros cinco segundos em que abre a boca.

E porquê? Porque muitos dos oradores que são ineficazes gastam os primeiros cinco minutos a dizer coisas maçadoras. Veja se já ouviu algo parecido: “Boa noite. É uma honra para mim estar aqui. Queria aproveitar esta oportunidade para agradecer o amável convite da pessoa X; Y e Z da empresa N. Muito obrigada pela apresentação. Ora bem: aqui está quem sou eu, o que estudei na universidade XPTO, com a classificação de 20 valores, e onde. Aqui está quando entrei para a empresa que represento agora, e levem já com a aborrecida história da minha empresa, de preferência em detalhe e só com sucessos e a lista infindável de todas as cidades onde estamos. Aqui estão os 14 pontos que vou abordar na minha apresentação (e já que isto vai demorar é melhor prestarem atenção desde já para depois se lembrarem do que vou dizer). E, já agora, as casas de banho são lá ao fundo e o coffee break é às 10h30, e aproveitem porque hoje há fruta laminada. Vamos lá então começar”. Já adormeceu? Se ainda estiver a ler, é uma sorte. Para ambos. E já passaram 2.91 minutos de oralidade. Agora imagine com as pausas comuns do arranque… os cinco minutos da praxe já se teriam esgotado, e o orador ainda nem tinha realmente começado. Aqui fica desde já uma ajuda para saber exatamente quanto tempo tem a sua mensagem, em tempo de leitura e de fala.


Retomando, para ser um comunicador mais eficaz experimente focar toda a sua atenção na audiência em vez de em si próprio, logo no início. Imagine que começava assim: “Estava agora mesmo no corredor a falar com o Luís, e ele dizia-me: ‘Sara, acabei de perder o meu melhor cliente porque ele diz que os meus preços são muito altos.’ O que posso fazer, Sara?”.


Talvez não seja a mais brilhante abertura de sempre e nem vá ganhar o Nobel de Literatura, mas é bastante eficaz, e as razões são estas:

  1. O Luís fica preso ao discurso porque menciona o nome dele;
  2. Todos os outros à sua volta se identificam com o problema que o colega tem; e agora ‘eles’ também estão a ouvi-lo;
  3. Toda a audiência fica surpreendida por ser isto a primeira coisa que sai da sua boca, visto estarem à espera dos agradecimentos da praxe, ou vê-lo a ler algumas notas, ou ainda começar da mesma forma que todos os outros oradores que o precederam;
  4. O orador aparenta estar extremamente confiante porque parece que está a falar de improviso, com mais à vontade do que a própria audiência se sentia até então (mesmo fazendo isto parte do seu plano inicial).


Vamos ao plano B, para todas aquelas vezes em que não terá oportunidade de auscultar a sua audiência 10 minutos antes. (Repense a utilidade do welcome coffee). Mas tudo bem, às vezes acontece. Também já me aconteceu. Nesse caso, comece por fazer uma pergunta à audiência e verifique quantas respostas obtém. Assim garante que começa de forma diferente de todos os outros e agarra a audiência na fase mais difícil de os cativar. Certifique-se apenas de uma coisa: que as perguntas que fizer são reais e com real interesse na resposta. O que significa que os seus olhos e cérebro têm de prestar a devida atenção às respostas e a quem as dá. E, já agora, faça perguntas com valor e intenção. “Quantos de vocês gostariam de receber mais dinheiro e trabalhar menos horas por semana?”. Ora, esta não é uma pergunta com valor, apenas ofensiva. Uma boa pergunta procura valor na resposta e tem um objetivo claro. Aprendi com uma amiga coach este termo fantástico: burning question. Uma pergunta que incendeie o rastilho de um novo pensamento será sempre uma excelente forma de começar um discurso. Experimente e conte-nos como correu. Até já. 

20-10-2016
 

SaraBatalha2Sara Batalha (Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.), CEO da MTW Portugal (que integra a Media Training Worldwide Global, empresa de origem americana especializada em media training, public speaking e presentation training skills), recebeu formação em Nova Iorque pelo presidente da MTW Global, TJ Walker. Autora do método “desconstrução do discurso” (com o qual treina a comunicação de políticos, CEO, empresários e profissionais que querem influenciar através da sua comunicação), é certificada em coaching pela International Coaching Community, em DiSC 2.0 pela Inscape, e em micro expressões pelo Paul Ekman Group, aplicando esse conhecimento na especialização em communication behaviour profile analyst.
Acumula cerca de 20 anos de experiência em comunicação, tendo sido jornalista e coordenadora de redação por mais de uma década (“Expresso”, RTP1 e RTP2). Foi consultora de comunicação para agências e empresas, lecionou no CENJOR - Centro de Formação Avançada para Jornalistas, e é docente convidada em universidades do país. É ainda oradora frequente em conferências nacionais e internacionais, marcando presença nos media com análise política em linguagem não-verbal.