Luís Pais Correia, CEO da Dalkia para a Zona NAMEA e Vice-Presidente executivo do Grupo, gestor de um volume de negócio superior a dois mil milhões de euros e responsável por mais de 15.000 colaboradores, refere que "Portugal necessita de uma verdadeira Gestão Estratégica" e apresenta três medidas que acredita serem fundamentais ao país para inverter a situação.
Temo o risco de não se aproveitar a presente situação de crise para se gerarem consensos que permitissem a criação de uma plataforma para o futuro.
Luís Pais Correia é responsável por mudar o paradigma de negócio nos países que coordena, passando de contratos de curto prazo e margens baixas para contratos de vários anos, apostando na diferenciação face à concorrência. Este pôs em prática vários programas internos de reposicionamento estratégico, entre os quais a redefinição da missão, visão e valores da empresa, no sentido de a transformar numa meritocracia, com enfoque no cliente. Entre as suas principais responsabilidades conta-se a responsabilidade pelos vários country managers. Neste âmbito, desenvolveu programas de gestão de talentos e liderança para estimular capacidades de chefia em gestores com elevado potencial, e impulsionou as Ambassador Initiatives, que promovem formas inovadoras de trabalhar. Foi o vencedor do Best Leader Award* em 2011 na categoria de Líder Internacional.
Se realmente o Estado quer apoiar as empresas portuguesas, devia começar por pagar a totalidade da sua dívida aos fornecedores (muitas vezes prometido mas nunca realizado) com juros!
Portal da Liderança (PL): A Dalkia é líder mundial em termos de eficiência e otimização energética e está presente em mais de 40 países por todo o mundo. Que âncoras de liderança estão na base deste sucesso?
Luís Pais Corrreia (LPC): A Dalkia tem tido muito sucesso e continua a crescer a nível mundial porque a sua oferta corresponde a uma verdadeira necessidade de mercado. Razões económicas, redução dos consumos energéticos, e ambientais, redução de emissões de CO2, são centrais na formulação das políticas dos atores públicos e privados. Ser capaz de oferecer soluções que respondam de forma eficaz e eficiente a estas questões sido a base do sucesso da Dalkia.
A Liderança tem naturalmente um papel fundamental que começa por assegurar que o Plano Estratégico reflete a realidade e não a nossa perceção da mesma e que os recursos internos e exernos estão disponíveis para garantir a sua tradução em Planos de Ação dirigidos às necessidades, atuais e futuras, dos nossos clientes.
PL: Enquanto Vice-Presidente Executivo da Dalkia - Atlântico Norte, Médio Oriente, Ásia e Pacífico, quais os principais desafios que se lhe deparam?
LPC: O contexto, as oportunidades e os desafios são muito diferentes em cada país. A abordagem para um país aberto e com possibilidades de financiamento local, como, por exemplo, o Canadá, é muito diferente da que se pode ter num país com estruturas centralizadoras a vários níveis e indefinições regulamentares importantes, como, por exemplo, a China. Ser capaz de adaptar a nossa Estratégia aos diferentes contextos e escolher os colaboradores locais e internacionais para liderar as empresas dos diferentes países é sem dúvida o meu principal desafio.
PL: Em termos de liderança, o que faz a diferença em cada uma dessas geografias (Atlântico Norte, Médio Oriente, Ásia e Pacífico)?
LPC: É fundamental que, quer ao nível corporate quer ao nível local, haja uma compreensão profunda dos contextos (económico, regulamentar, político...) para que se possa adaptar a Estratégia e nomear os responsáveis mais adequados a cada país. O Grupo investe, naturalmente, mais em países com forte potencial de crescimento do que naqueles com economias maduras e os perfis do negócio e dos líderes de cada atividade são diferentes em função das perspectivas de negócio.
Em Mercados emergentes são necessários líderes capazes de gerirem maiores riscos e influenciarem positivamente as políticas definidas pelos governos nas áreas em que estamos presentes.
Por outro lado, em países maduros muitas vezes é necessário seguir uma estratégia de nicho, procurando modos de continuar a acrescentar valor aos nossos clientes de forma permanente. Líderes com caraterísticas diferentes para contextos diferentes.
PL: Enquanto português e tendo sido CEO da Dalkia Portugal, como vê o estado atual do país?
LPC: Com alguma preocupação mas também com grande esperança no futuro. A preocupação resulta do risco de não se aproveitar a presente situação de crise para se gerarem consensos que permitissem a criação de uma plataforma para o futuro: um acordo envolvendo os partidos e os parceiros sociais relevantes para que um conjunto de princípios e políticas pudessem ser definidos para um horizonte a 20 anos em áreas que não deveriam ter componente ideológica (há-as sempre bem sei e o “bem comum” é um conceito demasiado abstrato mas com “boa vontade” seria possível): Justiça, Educação, Defesa, Saúde....Pessoalmente deixava pouca coisa de fora, mas isso é porque não sou político...
Não há nada mais irritante (e que se traduz na prática por desperdício de dinheiros públicos e privados) do que cada vez que muda o governo todas as políticas do governo anterior sejam postas em causa.
Tenho Esperança porque vejo que as novas gerações conseguem ser muito mais realistas do que as que as precederam. São melhor formadas, têm mais informação e abertura de espírito, sólidas bases para, a prazo, termos uma verdadeira meritocracia no nosso país.
PL: Sendo líder a nível internacional e com uma vasta experiência, que medidas acredita serem fundamentais tomar para inverter a situação?
LPC: Acho que o país necessita de uma verdeira Gestão Estratégica, com definição clara de prioridades atuais e futuras. Medidas que podem parecer interessantes no curto prazo podem revelar-se catastróficas no médio prazo.
Exemplos de medidas concretas:
1) Redução dos principais custos de produção, a começar pela Energia. Para um investidor é irrelevante se a Energia que consome for produzida por centrais eólicas, hídricas, ou gás. O que importa é o custo dessa energia. 3 Coisas a fazer: Parar de subsidiar energias alternativas, reduzir os impostos incluídos na fatura elétrica ou de combustível, e apostar na exploração do gás de xisto.
2) Por muito que se diga o contrário, Portugal é um pequeno país periférico e sê-lo-á sempre. Isto implica que todos os aspetos Logísticos são cruciais para manter Portugal no mapa da Europa e o mais possível nas rotas comerciais transcontinentais. Proposta hiper-simples: Não vender a TAP! Por mais “garantias” que um qualquer comprador possa dar de manter Lisboa (e o Porto) como centro estratégico. Já hoje é muito complicado assegurar ligações a partir de Lisboa para qualquer destino não Europeu (neste caso sei bem do que falo) e isso afasta-nos de centros de decisão e reduz a possibilidade que centros de competência se instalem em Portugal. Outras propostas: TGV de mercadorias e passageiros para Madrid a partir de Lisboa obviamente; Portos com tarifas atrativas; aceleração da colaboração com o Porto de Singapura que opera Sines…; Rede 4G em todo o país!
3) Se realmente o Estado quer apoiar as empresas portuguesas, devia começar por pagar a totalidade da sua dívida aos fornecedores (muitas vezes prometido mas nunca realizado) com juros! Crédito à exportação (incluindo necessidades de Fundo de Maneio) para PMEs e start-ups fácil e barato por parte do banco do Estado com base em análises simples do potencial de criação de valor.
PL: Que conselhos dá para uma melhor gestão e liderança na lusofonia?
LPC: O grande motor para melhorar a gestão e liderança no conjunto de países da lusofonia deverá ser o Comércio baseado no Emprendedorismo. Fazer negócios em Português deveria ser mais fácil do que noutra língua qualquer.
Os Estados não podem criar empreendedores. O que podem fazer é criar as condições para que os indivíduos com espírito empreendedor possam crescer e correr riscos.
A mudança de mentalidades demora gerações mas pode-se fazer muito, por exemplo, a nível fiscal, para incentivar o empreendedorismo, nomeadamente no espaço da lusofonia. Por outro lado ainda há muito a ideia de que quem não tem um título (Dr, Eng...) não tem valor. Devíamos seguir o exemplo anglo-saxónico e julgar as pessoas pelo que fazem e não pelas escolas onde andaram ou pelos amigos que têm. Meritocracia como valor da sociedade com exemplo vindo do topo.
Temos muito boas escolas de gestão cuja contribuição será fundamental para melhorar os níveis da gestão e da Liderança. O que nos falta por vezes é capacidade de gestão estratégica, o que se percebe olhando para as maiores empresas portuguesas. Na maior parte ou pertencem (são controladas) pelo Estado ou por famílias. Com exceção das multinacionais, a maior parte das empresas organiza-se e escolhe líderes em função dos constrangimentos que o Estado (e os políticos) lhes impõe e não dos mercados que pretendem servir ou conquistar. Solução para mudar: acabar com a economia tutelada e incentivar a inovação estratégica e o talento. Proposta: Ligação com clusters de inovação a nível global como a Leadership Business Consulting preconiza há muito tempo. Em vez de colocar empresas inovadoras no Tagus Park ou em qualquer outro lado em Portugal, dever-se-ia incentivar essas empresas a estabelecerem-se em Silicon Valley ou em qualquer sítio do mundo onde possam interagir com os melhores do mundo na sua área do conhecimento.
PL: Foi Chaiman da Câmara de Comércio Portuguesa no Reino Unido. Quais as oportunidades de negócio que o país encerra?
LPC: O Reino Unido tem uma economia aberta, concorrencial e muito dinâmica. Qualquer empresa que tenha um produto inovador e que responda a uma necessidade do mercado britânico tem um forte potencial de sucesso. Existem alguns casos de sucesso relativo de empresas portuguesas no UK. Na minha opinião, para que esses sucessos sejam ampliados e extendidos será necessário que as nossas empresas ganhem escala, entre outros, através de parcerias estratégicas com atores ja presentes nesse (e noutros) mercado(s).
PL: Qual a situação que o fez aprender mais em termos de liderança e o que aprendeu?
LPC: Já tive muitas situações ao longo da minha carreira onde foi necessário despedir pessoas, muitas vezes sem que estas tivessem responsabilidade nos factos que conduziram a esse desfecho. É raro que um despedimento não seja um drama individual, que muitas vezes pode tornar-se num drama coletivo. Tenho também a experiência contrária, onde através de renegociações de salários e aumento da flexibilidade foi possível manter os postos de trabalho e até, ao fim de um certo período, começar a recrutar novos colaboradores. Acho que qualquer líder deve ser responsável e pesar bem as consequências do que faz hoje no futuro da empresa. Dizer a verdade é sempre a melhor Estratégia e muitas vezes falta coragem aos líderes, empresariais ou políticos, de fazerem o que sabem ser o mais certo porque privilegiam o curto-prazo.
A Capacidade de Liderar processos de mudança é fundamental em períodos dificeis e distingue os líderes dos meros gestores do quotidiano.
PL: Qual o líder nacional ou internacional cuja liderança destaca e porquê?
LPC: Nelson Mandela será sempre uma figura inspiradora para mim. Da perseverança que lhe permitiu resistir durante anos na cadeia sem nunca perder a Visão do que era realmente importante, até aos pequenos gestos que contribuiram para criar uma nova Nação, como o seu apoio à equipa de râguebi da África do Sul no compeonato do mundo de 1995, previamente um símbolo da diferença racial, todos os seus gestos e ações são marcas de um grande líder.
Como alguém disse, a única coisa mais forte do que o medo é a Esperança. Mandela ensinou-nos a ter Esperança e isso, por si só, é um legado imortal.
PL: Quais são os três principais desafios que confrontarão os líderes nos próximos 10 anos?
3) Aproveitarem as oportunidades que irão surgir nas redes de conhecimento onde estarão inseridos. Haverá mais estruturas híbridas e flexiveis e menos grandes empresas, pelo que a liderança terá de ser diferente.
PL: Quais são as três qualidades mais importantes para um líder nos próximos 10 anos?
2. Serem hiper-rápidos na tomada de decisão e promoverem estruturas de decisão multi-polar e funcionamentos em rede, guardando o “controlo” operacional; 3. Terem uma visão verdadeiramente global e serem capazes de antecipar as tendências macro.
PL: Onde mais tendem a falhar os líderes?
LPC: Na incapacidade de antecipar as mudanças à volta deles e de se adaptarem a tempo.
*O Best Leader Awards é uma iniciativa promovida pela Leadership Business Consulting, que visa distinguir anualmente as personalidades que se destacaram como “Líderes” em vários domínios. O Best Leader Awards é uma TradeMark registada internacionalmente.
Luís Pais Correia é Licenciado em Engenharia no IST, com um MBA pela Universidade Catolica e um PhD pela École Polytechnique Fédérale de Lausanne, Luís Pais Correia lecionou em universidades públicas e privadas em Portugal e na Suíça. Chief Executive Officer (CEO) da Dalkia para a Zona NAMEA (North-Atlantic, Middle East, Asia-Pacific) que inclui o Canadá, os US, o Reino Unido, a Irlanda, A Escandinávia, o BENELUX, o Médio-Oriente, a Ásia incluindo a China e a Austrália, é igualmente Vice-Presidente executivo deste Grupo que atua no domínio da eficiência energética, da produção local de energia e do ambiente. Gere um volume de negócio superior a dois mil milhões de euros e é responsavel por mais de quinze mil colaboradores. Mudou o paradigma de negócio nos países que coordena, passando de contratos de curto prazo e margens baixas para contratos de vários anos, apostando na diferenciação face à concorrência. Pôs em prática vários programas internos de reposicionamento estratégico, entre os quais a redefinição da missão, visão e valores da empresa, no sentido de a transformar numa meritocracia, com enfoque no cliente. Entre as suas principais responsabilidades conta-se a responsabilidade pelos vários country managers. Neste âmbito, desenvolveu programas de gestão de talentos e liderança para estimular capacidades de chefia em gestores com elevado potencial, e impulsionou as Ambassador Initiatives, que promovem formas inovadoras de trabalhar. Apesar da crise que atingiu a Europa, criou postos de trabalho nos países sob a sua gestão, através da flexilização laboral, cortes salariais a par do desenvolvimento de novos negócios, compensando o retorno nas áreas mais afetadas pelas dificuldades. Nos últimos 3 anos o EBITDA da Zona registou um crescimento de 50%.