Essenciais para ter sucesso em ambientes de trabalho complexos e em constante evolução, as metacompetências requerem pensamento crítico, autorreflexão, concetualização e julgamento racional. E implicam uma aplicação mais flexível de competências.
Andrea Correia de Jesus
Todos os dias nos confrontamos com a mudança. A um ritmo vertiginoso descarregamos mais uma app que nos vai facilitar num aspeto da nossa vida, como gestão financeira ou nutrição, ou aprendemos mais uma ferramenta no trabalho porque temos de acompanhar as mais recentes tecnologias e inovar. E a área das competências não escapa à onda de mudança. Cada vez mais, as empresas procuram saber quais serão as competências de futuro, tema muito ligado à evolução das funções profissionais, a par com a crescente digitalização e a introdução de novas tecnologias. Tomemos como exemplo a evolução do vendedor de carros, que tradicionalmente conhecia todos os atributos mecânicos do veículo, a cilindrada do motor, etc.; agora apresenta um leque de competências diferentes, mais comparável a um vendedor de serviços, e que vão do tipo de tomada para carregar o carro elétrico às várias formas de financiamento. Este processo de mudança não se fica por aqui, avançando no sentido de vendas que cada vez mais se concretizam num espaço virtual. Esta evolução demonstra como as qualidades e as competências de um vendedor de carros estão em mudança constante, e que é necessário às pessoas nesta função se adaptarem e aprenderem a lidar com a crescente complexidade.
No livro “Metacompetência” Eugénio Mussak convida-nos a ver o que há além das competências. As metacompetências ou metacapacidades surgem como uma noção mais alargada de competências, que ultrapassam a aplicação dos conhecimentos técnicos e de competências específicas a uma área de trabalho, e englobam capacidades cognitivas, emocionais e sociais que podem ser aplicadas a várias situações, funções e vários contextos.
Uma diretora de Recursos Humanos explica de que forma explora as metacompetências junto dos colaboradores, ao colocar a questão: “quais são as competências ou capacidades em que é especialmente forte?”. Depois de a pessoa responder, optando, por exemplo, por capacidades analíticas ou facilidade em comunicar, ela pergunta: “o que faz com essa competência/capacidade?”. E elabora: “ou seja, descreva como usa as capacidades analíticas para executar as suas tarefas?” ou “descreva como usa a sua facilidade de comunicação para atingir objetivos?”. Desta forma consegue chegar a uma noção mais alargada das competências individuais, em que se tem em conta as qualidades e o caráter da pessoa.
Abordagem mais flexível
Há muitas definições e exemplos do que são metacompetências. No entanto é de notar que não existe uma lista universal, e que não se trata de definir novas competências, mas antes de introduzir uma nova abordagem ao conceito, e de unir competências técnicas com qualidades humanas. As metacompetências envolvem pensamento crítico, autorreflexão, concetualização e julgamento racional, e implicam uma aplicação mais flexível de competências.
Este tema é relevante na medida em que as metacompetências são essenciais para o sucesso em ambientes de trabalho complexos e em constante evolução, onde os profissionais precisam de se adaptar rapidamente a mudanças, de aprender novas competências e de lidar com desafios variados. Daí a importância de organizações e indivíduos introduzirem esta noção em processos de recrutamento e avaliação de desempenho, ou no seu currículo e na preparação de entrevistas de emprego.
Seguem-se alguns exemplos de metacompetências mencionadas em vários artigos e estudos sobre o tema. E fica o convite para descobrir quais serão as suas.
- Mentalidade empreendedora, não apenas no sentido de resolver problemas, mas de descobrir novas oportunidades.
- Disciplina sobre si próprio, que vai além de estabelecer objetivos, e que inclui perseverar no sentido de os atingir, criando planos, respeitando-os e solucionando desafios ao longo do trajeto.
- Autonomia na tomada de decisões e responsabilidade pelas decisões tomadas. Inclui o processo individual que leva à tomada de decisões, como recolher e analisar informação, reconhecer potenciais riscos e escolher as melhores alternativas.
- “Designer type thinking”, que envolve saber recolher informação de várias formas e em vários contextos, explorá-la e reorganizá-la como peças de lego, e criar algo.
- Resolução de problemas, que inclui usar as capacidades analíticas e a comunicação para compreender as causas e a origem do problema, e explorar possíveis cenários para o ultrapassar de forma individual ou em equipas.
Com o intuito de preparar e guiar os colaboradores num futuro incerto e em constante mudança, as organizações focam-se em definir listas de metacompetências para usar na gestão de desempenho e especialmente do desenvolvimento dos seus colaboradores. Também os testes de personalidade atuais utilizados para identificar as capacidades individuais e para medir e melhorar a eficácia, por exemplo, como líder, se baseiam nas metacompetências.
Nada como aproveitar esta onda de descoberta do que é necessário para estarmos “future ready” (preparados para o futuro), para refletir sobre as nossas competências, capacidades, qualidades pessoais, e partir em busca de quais serão as suas metacompetências. Boa sorte na exploração!
03-05-2023
Portal da Liderança
Andrea Correia de Jesus, formada em Economia pela Universidade Nova de Lisboa, é apaixonada pelo desenvolvimento de pessoas. Com experiência estratégica e operacional junto de equipas e stakeholders a todos os níveis, é especialista em desenvolvimento de liderança na empresa internacional de consultoria de gestão LBC. Regressou ao país de origem, Portugal, após uma carreira internacional especializada em gestão de talento – em que trabalhou na Daimler e na Mercedes em países como os EUA, Reino Unido, França, Singapura e, mais recentemente, na Alemanha. O seu foco é colaborar com líderes no sentido de melhorarem o impacto dos negócios na globalização, assim como na atração e no desenvolvimento de talento.