Os Líderes Nascem, Fazem-se e … Acontecem - Carlos Oliveira

Os Líderes Nascem, Fazem-se e … Acontecem - Carlos Oliveira
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A literatura sobre o tema da liderança é marcada pelo debate sobre se os líderes nascem ou fazem-se. De uma forma simplista, as implicações de cada perspetiva são as seguintes. 

Se os líderes nascem, o que é importante é recrutar e escolher bem as pessoas para os cargos de liderança. Se os líderes se fazem, o que é importante é formar as pessoas para os cargos de liderança e gerir carreiras.

O Que Mostra a Realidade

Na prática, o que verificamos é que nenhuma das perspetivas é totalmente auto-suficiente. Os líderes nascem e fazem-se, em graus diferentes conforme cada caso. Há pessoas que nascem com qualidades inatas de liderança, mas precisam sempre de formação e desenvolvimento pessoal.

Umas precisam mais ou muito mais do que outras. Por outro lado, por mais e melhor que seja a formação e o processo de desenvolvimento, há pessoas que muito dificilmente terão qualidades de liderança necessárias para exercer cargos de liderança ou liderar simplesmente (uma vez que a liderança não é exatamente um cargo, mas uma ação continuada).

Na realidade, em vez de “os líderes nascem OU fazem-se”, temos “os líderes nascem E fazem-se”. Atualmente, a maior parte dos académicos inclina-se para um peso igual para o “nascer líder” e para o “fazer-se líder”.

Mas a vida real mostra-nos que esta perspetiva académica não chega. Ter qualidades inatas de liderança e receber formação não são suficientes para exercer cargos de liderança ou para liderar sustentadamente.

A Importância da Circunstância

Há um elemento adicional que a academia não gosta de endereçar porque não é fácil de arrumar em conceitos bem definidos ou de modelar. Esse elemento é a “circunstância”. A “circunstância” tem duas dimensões. Por um lado, tem a ver com o contexto diferenciado de cada pessoa, como a família, os amigos, o estatuto social, a geografia, entre muitos outros fatores de contexto que limitam ou promovem as oportunidades pessoais. Por outro lado, tem a ver com a dinâmica de evolução dos valores sociais e de contexto e com eventos singulares ou incidentes inesperados e fora do controlo da pessoa e do seu grupo de apoio que abrem ou fecham oportunidades em cada momento.

A vida real mostra ao longo da história que a circunstância é um elemento fundamental para a ascensão e queda de muitos líderes, em várias dimensões. Os livros de história estão cheios de exemplos de incidentes que mudaram a história de um líder e de um povo. A “Long Walk to Freedom” de Nelson Mandela teria outro desfecho se não tivesse havido a queda do “Muro de Berlim” em 1989 e o consequente fim da Guerra Fria que deram ao mundo ocidental a confiança necessária para reforçar a imposição do ANC e do embebido e inseparável Partido Comunista Sul-africano, seu suporte organizacional, ao resistente regime sul-africano.

O escritor Malcolm Gladwell, no livro best-seller “Outliers” mostra como “eventos singulares”, ou seja, as circunstâncias, e preceitos sociais, moldam o sucesso das pessoas em áreas muito distintas.

Implicações para a Liderança

  1. O sucesso na liderança obviamente não é uma questão de destino e fado, mas certamente também não uma matéria linear como vem nos livros de liderança, que têm um valor relativo na vida real. Por vezes, o que vem recomendado nos livros é o oposto do que é recomendado para uma dada circunstância. A liderança é assim mais arte do que ciência.
  2. Quem pretende ascender a cargos de liderança ou simplesmente liderar, deve estar atento, saber ler e agarrar as oportunidades quando aparecem. Quem não ouviu já “Eu tive a oportunidade, até fui convidado, mas não quis ou não estava preparado”.
  3. A vertente política - alianças, coligações e obtenção de apoios - é tão importante como as qualidades de cada um para ascender a posições de liderança.
  4. As pessoas que lideram não são necessariamente as pessoas mais qualificadas, o que explica parcialmente a instabilidade das lideranças.

 

Os Líderes Admiráveis

Uma derradeira implicação incide sobre os líderes admiráveis. Há líderes e líderes. As pessoas verdadeiramente admiráveis não são as que ascenderam à liderança através de um processo fácil, de herança, da família, dos amigos, do contexto, da circunstância, mas sim aqueles que ascenderam contra todas as circunstâncias adversas. Uma vez no poder, não são aqueles que têm bons resultados quando tudo está a favor, mas os que enfrentam as tempestades e saem vitoriosos. Os que desafiam o seu destino e o moldam. Os líderes admiráveis são os que enfrentam e superam as adversidades e assim moldam ou mostram uma fibra, ou um caráter, diferente de todos os outros. Adicionalmente, apesar das suas vitórias, exercem o poder de forma virtuosa e humilde. Como disse Abraham Lincoln: “Few can stand adversity, but if you want to test a man’s character give him power.”

Os líderes nascem ou fazem-se? Nem um nem outro. Os líderes nascem e fazem-se e … “acontecem”.

 


CMO-PLCarlos Miguel Valleré Oliveira é CEO da LBC, empresa internacional de consultoria de gestão presente em países como a África do Sul, Angola, Brasil, Cabo Verde, EUA, Espanha, Moçambique e Portugal. O antigo presidente da CCILSA – Câmara de Comércio e Indústria Luso Sul-Africana assina a rubrica "Ponto de Vista" no Portal da Liderança sobre os temas da liderança-gestão, economia-sociedade e inovação-empreendedorismo.