Gamificação e o foco no talento

Gamificação e o foco no talento
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Imaginem uma organização com desafios de retenção ou de motivação dos colaboradores que resolve aplicar uma estratégia de gamificação. Imaginem que os colaboradores passariam a ficar envolvidos, sendo estimulada a relação com os colegas, promovida a autonomia de decisão e definido o seu propósito de forma clara. Imaginem o poder de uma ferramenta destas. Conseguem imaginar?

Manuel Pimenta

No mundo em que vivemos, o sucesso das empresas depende cada vez mais do seu capital humano. Arrisco até que, em muitos casos, depende mais ainda do que da sua estratégia de negócio.

Opinião semelhante tem a Gartner que, no seu mais recente simpósio – ITxpo (decorrido no final de outubro na Florida, EUA), ao debater estratégias para o negócio digital, deixou claro que, a haver um fator crítico de sucesso de uma organização, o seu foco seria no talento. Ou seja, cativar as melhores pessoas, fazê-las crescer em conjunto com a empresa e saber potenciar as suas skills da melhor forma para ambos. Ainda segundo a consultora americana, este foco implica que exista, na definição da sua estratégia, não apenas uma preocupação com a tecnologia e os conceitos de negócio, mas também com o tema human engagement, ou envolvimento humano. E aqui inclui a gamificação como elemento-chave, mensagem que, aliás, Brian Burke, vice-presidente para a investigação, já tinha passado em 2014.

A gamificação é, por definição, o uso de conceitos dos jogos para a resolução de problemas e envolvimento de pessoas. Tem como objetivo a utilização de mecânicas tão simples quanto pontos, crachás e rankings, passando por dinâmicas complexas de equipa, narrativa e desafios progressivos, em contextos do dia a dia, para motivar pessoas e ultrapassar obstáculos. Estas técnicas são capazes não só de envolver inicialmente as pessoas pelo apelo da recompensa e da gratificação, mas também de gerar envolvimento duradouro e provocar uma verdadeira transformação comportamental. 

Um dos fundamentos da gamificação é o trabalho no campo da motivação feito por Edward L. Deci e Richard Ryan e, alguns anos mais tarde, por Daniel Pink. Por estes três investigadores sabemos que, mais que o lado extrínseco da fuga à dor ou da busca do prazer, somos intrinsecamente motivados pela competição e a colaboração, o podermos tomar decisões sobre o que fazemos, como fazemos e quando fazemos, a aprendizagem em direção ao domínio de um tema e, em muitos casos, um desígnio maior que nós, uma missão.

Curiosamente, desde tempos imemoriais que os jogos são utilizados com sucesso para cultivar em nós estes aspetos, forçando-nos, de forma totalmente voluntária, a ultrapassar obstáculos, trabalhar em equipa e a lidar criativamente com situações inesperadas. E, com o advento dos videojogos, uma indústria que hoje gera biliões de dólares anuais e ocupa milhões de horas por semana de toda a população do planeta, essa capacidade assumiu uma dimensão global.

Este poder dos jogos constitui, portanto, o principal racional da gamificação; não só como ferramenta de envolvimento a curto, médio e longo prazo, mas também como ferramenta transformadora: se os jogos conseguem cativar as pessoas horas a fio, mesmo requerendo uma mudança para mundos virtuais, e se isso as faz crescer como seres humanos, do que será capaz o uso ágil de conceitos dos jogos, completamente integrado no dia a dia de milhões de pessoas?

Traduzindo este poder para as organizações e o foco no talento, dificilmente há como evitar que em muitos casos se traduza numa mudança cultural. Imaginem uma organização que enfrenta desafios de retenção ou de motivação dos seus colaboradores e que resolve aplicar uma estratégia de gamificação bem desenhada e adequada à sua demografia. Imaginem que, na sua grande maioria, estes colaboradores passariam a ficar envolvidos nos desafios da organização, sendo estimulada a relação com os colegas, promovida a sua autonomia de decisão, desafiado o seu conhecimento de negócio e definido o seu propósito de forma clara. Imaginem o poder de uma ferramenta destas nas mãos das novas gerações.

Conseguiram imaginar? Pois esta é a força da gamificação.

07-11-2016


ManuelPimentaSmall

Manuel Pimenta é gamification designer na Fractal Mind desde o início de 2017.
Mestre em Engenharia Informática, desempenhou durante mais de cinco anos funções de análise e desenvolvimento de software, sendo que mais tarde se especializou nas metodologias de design thinking e gamification. 
Trabalhou na Novabase até ao final de 2016, maioritariamente em projetos de reengenharia de processos, fazendo, sempre que possível, uso de conceitos e mecânicas de game design para a resolução de problemas. Nesta empresa foi ainda formador de design thinking e de gamification design. 
É certificado em gamification design e orador convidado em diversos congressos e eventos de tecnologia, como o Gamification World Congress 2016 ou a Web Summit 2016.