Os pequenos grandes desafios de liderar emoções – Nuno Santiago

Os pequenos grandes desafios de liderar emoções – Nuno Santiago
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Devo confessar que, ao contrário do que pensava, tive reações de millennials ao artigo anterior. Ainda que uns mais satisfeitos do que outros com o retrato que deles fiz, (aparentemente) todos o leram até ao fim sem adormecerem, sem pararem a meio, sem olharem para o smartphone pelo menos cinco vezes e sem responder a três emails. Nada mau.

Nele, tinha prometido distanciar-me sempre das verdades absolutas e escrever artigos interessantes, úteis, sobre temas relevantes e, last but not least, o menos enfadonhos possível. Vou agora tentar cumprir essa promessa.

Começo com uma pergunta. 

Qual o papel do líder na gestão da relação dos colaboradores com a empresa e, principalmente, na gestão das relações entre eles? 

Por muito que a tecnologia domine (e, nalguns casos, se imponha), as organizações são constituídas por pessoas, por seres sociais, por pessoas com emoções. O sucesso das organizações depende assim, e em muito, do nível de envolvimento, de empatia e de motivação que os colaboradores (individual e coletivamente) criam com a liderança.

Já do líder é esperado que, perante determinados contextos, tome a decisão mais adequada, de acordo com a informação de que dispõe. Acresce ainda, e é muitas vezes tema de reflexão, considerar se o líder deve ou não (como se fosse possível dissociar) deixar emergir a sua dimensão afetiva na gestão da organização (e dos seus ativos tangíveis e intangíveis).

Assiste-se hoje a uma crescente padronização de metodologias, à diluição da localização e à identificação de grandes verdades que conduzirão todos nós a um estado de bliss. 

Todos sabemos que muitas das teorias do tudo, hoje dadas como absolutas, serão reconhecidas amanhã como meros passos na longa caminhada da descoberta. 

Esquecemo-nos, no entanto, e muitas vezes, de que precisamos de estabelecer redes de relações que constituam o nosso porto de abrigo e esquecemo-nos frequentemente de que a organização em que trabalhamos é, logo a seguir à família, um dos espaços onde mais nos realizamos como seres individuais e coletivos.

Liderar é, muitas vezes, ser o capitão, o farol, o conselheiro, o decisor. 

Liderar é gerir sensibilidades, vulnerabilidades, emoções. 

Nestes campos, a razão é, muitas vezes, desafiada. O líder tem de saber gerir diariamente as dualidades razão/emoção, objetividade/subjetividade, e reflexão/intuição. Em si próprio e nos outros. 

Embora não exista um sinalizador que nos ajude a identificar qual o melhor caminho, há dimensões inerentes ao ser humano que podem ser treinadas, para nos ajudarem no momento da tomada da decisão. Tal pressupõe, no entanto, a rutura da visão que privilegia o saber-fazer (qualificação profissional), em detrimento do saber-ser.

A opção não deve recair sobre nenhuma em particular, mas sim na complementaridade de ambas, em doses equilibradas, de forma diferente consoante o contexto, a situação e o perfil dos colaboradores em causa. 

Por exemplo, um colaborador com tarefas mais criativas procurará no líder caraterísticas como a inovação, o risco e o rasgo; já um colaborador com tarefas mais concretas, privilegiará a estabilidade, a segurança e o conservadorismo. 

É na capacidade de dosear estas duas dimensões do líder que se constrói uma liderança mais assertiva, mais justa e ganhadora. Mas não é fácil..

Hoje, é exigido ao líder um perfil de banda larga (já agora, de fibra), ser capaz de reagir e de se adaptar aos imprevistos e a cenários de mudança. 

E eis-nos chegados ao leitmotiv deste artigo, o conceito de Inteligência Emocional (IE)*. São cinco as competências da IE: autoconhecimento emocional; controlo emocional;auto motivação; empatia e relacionamento pessoal.

Pode parecer antagónica a convivência entre a emoção e a razão, mas, na verdade, estas complementam-se, devendo cada uma ocupar o seu lugar. 

Neste contexto, a ação do líder pautar-se-á pela consciente integração de ambas, mediante o estímulo. Nas organizações modernas, assiste-se (apesar de tudo, menos do que seria desejável) ao abandono de máximas como “no trabalho deve usar-se a cabeça e não o coração” ou “se não existir um distanciamento afetivo, não é possível tomar decisões duras”. 

É, portanto, crescente a tendência para se assumirem estilos de liderança que privilegiam a capacidade de ouvir, de negociar, de gerir conflitos, de definir estratégias e de influenciar, positivamente, o comportamento das pessoas com quem se trabalha. 

O líder moderno deve estar consciente de que pode influenciar sem manipular, tratando todos de forma similar e isenta, pois ele próprio é agente formador de valores e está constantemente a ser observado e escrutinado, sendo muitas vezes incompreendido por aqueles que reagem apenas aos métodos mais convencionais da autoridade imposta. 

Complementarmente, esta versão 2.1 de líder (ainda versão beta, mas em constante upgrade) mais conduzido pela IE terá menos tendência para transformar o clássico ROE (return on equity) no narcisista e indesejado ROE (return on ego)... tema para o próximo artigo.

Os líderes de sucesso são, pois, os que possuem a capacidade de fomentar a empatia, os que permitem o autoconhecimento, a colaboração e a iniciativa. Estes são reconhecidos pelo seu autocontrolo e pela justiça na avaliação dos seus colaboradores, promovendo a eficiência, a satisfação e a produtividade. 

O que lhe reconhecem a si enquanto líder? 

* A Inteligência Emocional (IE) traduz-se na “capacidade de identificar os nossos próprios sentimentos e os dos outros, de nos motivarmos e de gerirmos bem as emoções dentro de nós e nos nossos relacionamentos" (Goleman, 1998).

 


Nuno-Santiago-Masemba-CEONuno Santiago é CEO da Masemba (Portugal e Angola), grupo editorial que detém as publicações Lux, Lux Angola, LuxWoman, Cristina, Revista de Vinhos e Divo Magazine. Iniciou a sua carreira na RDPE (agora Essentia), tendo criado a CPU Tourism Consulting, onde foi diretor executivo. Posteriormente foi diretor de desenvolvimento do grupo Amorim Turismo para Portugal, Angola e Moçambique, e administrador executivo da Fundação Essentia Príncipe, dedicada ao apoio ao desenvolvimento em São Tomé e Príncipe. Além de formado em Gestão e Planeamento e Turismo, pela Universidade de Aveiro, frequentou uma especialização em e-tourism na University of Surrey e é certificado em real estate, development and hotel investment pela Cornell University (EUA).